12 meses de orgulho

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Guilherme

Acabou o mês do Orgulho LGBTQIAP+. Agora vêm os outros 11 meses. Fiz questão de escrever este texto depois de virar a folha no calendário. Explico meus motivos e minhas reflexões: celebrar a diversidade e a luta contra o preconceito é absolutamente necessário, mas a pauta não pode ficar restrita aos 30 dias de junho. Isso porque ela transborda para as horas corriqueiras, quando as cores do arco-íris não costumam estampar anúncios festivos e empoderados nas redes sociais, nas ruas, nas empresas ou órgãos públicos.

O mês do Orgulho LGBTQIA+ existe porque a violência e a desigualdade persistem. Na última década, os ataques contra essa população explodiram no Brasil, como mostra o Atlas da Violência 2025, um verdadeiro monumento a (mais esta) vergonha nacional. De 2014 a 2023, os casos contra homossexuais e bissexuais cresceram 1.193%; contra mulheres trans, 1.111%; contra homens trans, 1.607%; e contra travestis, 2.340%.

A queda na subnotificação pode ter influenciado os números? sim. Dá para dizer que todas os casos foram de LGBTFobia? Não. Mas isso não esconde a rotina de violência verbal e psicológica sofrida por homossexuais, bissexuais, transexuais e travestis na rua ou em casa, na escola ou no trabalho, na igreja ou no bar.

Ao mesmo tempo, não se tem notícia de nenhuma pessoa cis heterossexual atacada por se relacionar com outra pessoa cis heterossexual. Não que seja algo desejável por uma questão de simetria, obviamente. Mas ilustra bem o abismo que separa as pessoas com base nas suas identidades de gênero, orientações e práticas sexuais.

Além desse cotidiano de agressões, a negação de direitos prossegue, mesmo que o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha, em 2019, criminalizado a LGBTfobia e reconhecido a omissão do Poder Legislativo. Pode-se firmar união estável desde 2011, homossexualidade no âmbito militar não é mais crime desde 2015, conquistaram-se direitos sucessórios desde 2017, a LGBTfobia foi equiparada ao crime de injuria racial em 2023 e as restrições para doar sangue caíram em 2020.

No entanto, a grande maioria das quase 3 milhões de pessoas LGBTQIAP+, equivalente ao Distrito Federal inteiro, ainda não pode ir na esquina ou entrar nas redes sociais sem ser incomodada por dedos que apontam a voz, o gestual, o olhar, o cabelo, a roupa, o calçado, a maquiagem, o desejo. É um inferno diário, que faz lembrar um verso de Caetano Veloso: nada vai prosperar enquanto todo mundo quiser saber com quem você se deita – ou quem você ama.

Em 40 anos de militância pelos direitos das pessoas LGBTQIAP+, parece que o tempo dá um passo para frente e outro para trás. Mas me sinto renovado, em lutar todos os dias, pelo básico direito de existirmos e sermos quem somos: fortes, como resume o slogan da Aids Healthcare Foundation (AHF), uma das maiores ONGs de HIV/Aids, direitos humanos e direitos LGBTQIAP+ do mundo, presente em 48 países.

Por isso, orgulho sim! De janeiro a junho, de julho a dezembro, todos os dias, horas e minutos, enquanto for necessário. Temos 334 dias pela frente, até o Mês do Orgulho de 2026.

Beto de Jesus

Diretor da AHF Brasil